Páginas

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

CRER X QUERER

Quando se fala em crer logo se associa à idéia de crer em dogmas, crer em milagres, ou crer em coisas fantasiosas, sem fundamento, etc. Mas há também o crer em coisas práticas, crer em prerrogativas e ideais, um outro tipo de crença mas que pode também levar à alienação justamente pela passividade do tão somente crer e mais nada.Por exemplo, é possível que alguém acredite de fato em um conceito legítimo como o de que a humanidade, o homem em si, deve evoluir como ser humano revendo e mudando seus paradigmas para realizar esta evolução, conhecendo a si mesmo, buscando pensar e agir melhor, etc. Mas ao mesmo tempo a própria pessoa que assimilou e assumiu estas verdades, pode ela própria não gostar de ver-se posta à prova de modo a ter que pensar sobre seus paradigmas ou mesmo não gosta de fazer esforço durante os episódios do seu dia-a-dia para identificar e modificar seus pré-conceitos formados e atitudes contrárias à verdade que consentiu... “Pra quê se estressar com estas coisas?!”, “é assim que as coisas funcionam com todo mundo, ninguém é ruim por isso...”, diz internamente para si mesmo, mas em outro momento lá está o crente achando lindo quando lê ou escuta algo que acredita que é importante e que crê já estar no caminho, crê já estar praticando, simplesmente porque reconhece aquilo como verdade. É mais um crente, daquele que apenas acredita que algo é uma verdade, mas saindo do êxtase daquele instante em que lustra sua preciosa “verdade”, não quer vivê-la como tal porque é “cansativo” lutar e crescer internamente, já basta a ocupação da rotina diária... “Seria bom”, mas ainda não... Possui o crer, mas não o substitui pelo querer. Vislumbra e admira o outro lado do rio, mas não faz a travessia.

Relembro a frase de William Shakespeare: “A transformação é uma porta que só se abre por dentro”. Cada um tem que despertar em si a vontade de querer viver com a nova postura que na busca reconhece ser melhor, alimentando a mente e o coração com o que for necessário para as etapas desta transformação, passando do crer, neste sentido, ao querer, e do querer ao fazer.
Como já escrevi em outro texto, alguém que me lê pode estar perguntando: “ele não possui estes defeitos que está criticando?”. E vou repetir a resposta: Sim, muitas vezes já me vi assim, mas desde o momento que passei a pensar e me questionar sobre isto, este tipo de postura passou a me incomodar, e desde então assumi a minha luta, e entre uma vitória aqui e uma derrota ali, vou me sentindo mais forte e querendo me superar. Como disse Carlos Drummond de Andrade: "só é lutador quem sabe lutar consigo mesmo". A pergunta final é: você já assumiu esta luta?


sábado, 15 de outubro de 2011

A UNIÃO

Poderíamos falar de união em muitos sentidos já que este termo é utilizado para expressar os mais diversos assuntos, fala-se em união empresarial, união de propósitos, ou da união como forma de associação para atingir interesses ou metas, podendo estas uniões serem ainda estabelecidas por prazos determinados ou indeterminados, mas o sentido que buscarei refletir é o da união fraterna e porque não dizer também "mística" dos homens e sua influência em sua psicologia e seu espírito.

Francis Bacon disse que "forças quando unidas são mais fortes", e de fato muitas pessoas movidas por um pensamento em comum ao unirem-se dão uma força a este pensamento e atuam para consolidá-lo de uma forma que não fariam sozinhas, o que explica um ditado nascido na cultura africana que diz: "quando o rebanho é unido, o leão deita com fome". A união nos ajuda a enfrentarmos  nossos temores e solucionarmos mais facilmente os problemas que nos entravam, tanto pelo incentivo gerado ao vermos que nossa luta ou dificuldade é também sentida e compartilhada com outro que está disposto a junto conosco encontrar a solução e superar a adversidade, como pelas soluções originadas de muitas mentes convergindo para resolver um problema em comum. A união nos gera uma coragem que nos brota no coração no momento que sozinhos nos acharíamos fracos ou vulneráveis mas que junto com outros sentimos fortalecer a luz da esperança de que é possível atravessar a escuridão, tal como as velas que sozinhas geram uma luz fraca na noite, mas lado a lado com muitas outras velas formam pela união uma luz muito mais potente. A união também nos ajuda desta forma e pelos mesmos motivos a dividir a carga de nossos sofrimentos.

Em nossa busca por evoluirmos a união é uma força e um poder, sendo a verdadeira união neste sentido a união das mentes, a união em um propósito comum que possa ser o norte das ações do homem, baseado na superação das diferenças, no propósito de aperfeiçoamento moral, de construção de um mundo melhor e mais humano. O desafio está em consolidar os laços desta união com pessoas que pensam diferente, pois isto nos obriga a darmos mais atenção e mais valor ao que temos em comum, diferentemente dos fanáticos que unem-se pelo próprio fanatismo e focam-se nas críticas das diferenças dos demais, geralmente movidos pelo seu apego às suas próprias crenças e superstições, gerando o entorpecimento da razão e o afastamento dos corações.

Há algo que deve ser diretriz em nossa união como homens na construção de uma sociedade e mesmo na construção de nossa própria trajetória de vida, e esta deve ser o propósito do Bem e a busca pela Verdade. Isto requer desprender-se das fôrmas de pensamentos e exercer a liberdade de pensar, admitindo que "o melhor" é algo que estamos constantemente construindo, e neste processo podemos ter até mesmo de reconstruir nossos conceitos e bases culturais quando estas mostram-se defeituosas já que o papel do construtor não é somente construir mas também desmanchar o que estava mal feito, reconstruindo algo melhor, e é importante refletirmos sobre isto se buscamos harmonia em nossas vidas e na humanidade, já que tentar conciliar a Verdade e a mentira será sempre uma falácia, e ainda que sob panos quentes sempre estará presente o separatismo com seu germe da discórdia e fantasma das guerras.

sábado, 1 de outubro de 2011

MÁSCARAS DA HIPOCRISIA

De acordo com o dicionário, hipocrisia é sinônimo de fingimento, impostura, simulação e falsidade. Falar sobre hipocrisia na sociedade, na política, nas religiões, não é aqui o meu objetivo, pretendo refletir sobre a hipocrisia que há em mim e em você que me lê. Não, não se ofenda, não estou dizendo que somos hipócritas “conscientemente”, se é que seria possível associar estas palavras já que o ser consciente não seria hipócrita, mas fica mais fácil de entender. A hipocrisia no seu aspecto macro (sociedade, política, religiões, etc.) é reflexo e consequência da hipocrisia que está no micro (homem).
Para que não haja hipocrisia deve-se buscar a coerência, o equilíbrio, entre pensamento, palavra e ação. Quando eu suponho ter dentro de mim uma verdade que assumo como tal, mas minhas palavras, meus diálogos com os demais, não refletem a dita verdade que outrora eu estava afirmando, então estou escorregando na hipocrisia. Se minhas palavras soam como um bem, podendo até mesmo servir no dado momento a estimular o bem no outro, mas eu internamente penso diferente ainda que esconda isto, estou também sendo hipócrita. E por fim se eu penso e falo, mas não faço, mais uma vez estou sendo hipócrita, e esta é o tipo que mais facilmente identificamos (mais facilmente ainda no outro) em uma sociedade aonde parecer substitui a necessidade de ser. Assim o sujeito logo supõe que se ele consegue parecer inteligente e culto, não precisa se esforçar para ser de verdade, se ele tem muitos livros e aprendeu a citar algumas coisas parecendo alguém que lê, não precisa então “gastar” seu tempo lendo, se o jovem “faz bonito” diante dos pais e parece um bom filho, logo não se esforça para ser o mesmo quando está longe dos pais já que ser “bom filho” é algo que importa aos pais dele e talvez não aos amigos. Da mesma forma para muitos basta parecer espiritualizado, repetindo frases desgastadas aonde menciona Deus ou praticando algum culto religioso para parecer que cultiva sua espiritualidade e merece a "piedade divina", enquanto não faz nem o mínimo do verdadeiro trabalho do homem espiritualizado que é crescer internamente, instruir-se e ser cada dia mais virtuoso e mais humano. Pensamento, palavra e ação devem estar unidos como vértices de um triângulo, o triângulo do caráter, se um dos vértices se rompe, desconfigura-se o caráter.
Mas pensamento, palavra e ação devem ser coerentes não apenas cuidando-se para não errar, mas também como um “exame de consciência” para fazermos regularmente e medirmos nossos passos na caminhada de nossa evolução, pois o ser que tem bons pensamentos, boas palavras, mas não sabe agir, ele pode estar falhando por não praticar o bem, mesmo que não esteja fazendo o mal. O ser que tem boas palavras, boas ações, mas não pensa, apenas aprendeu a seguir “boas regras” e acomoda-se, este pode estar simplesmente falhando consigo mesmo no livre exercício da razão, e quando as regras lhe faltarem, forem insuficientes eu até mesmo abaladas, ele possivelmente não saberá mais como caminhar. E ainda o ser que tem bons pensamentos, boas ações, mas não se exercita nas palavras, também está falhando pois o bem que se sabe não pode morrer consigo mesmo, é importante saber ensinar com o exemplo certo mas também com as palavras certas, por isto sempre os três juntos e em correspondência: pensamento, palavra e ação... mirando a evolução!
Mas até aqui alguém já teria me perguntado: será que eu não tenho também dentro de mim este germe da hipocrisia que estou aqui criticando? Tenho sim, e você não tem? Mas a minha já faz bastante tempo que começou a me incomodar, e em uma batalha ganha aqui, outra perdida ali, vou assumindo a luta... porque é fácil incomodar-se com a hipocrisia alheia mas é ainda mais fácil ser conivente com a própria, até porque é comum reconhecê-la no outro e é difícil descobrir que ela também está em si mesmo, chegando a ignorar-se a existência dela em si mesmo, mas está na hora de descobri-la. Oscar Wilde disse que: “o descobrimento é o primeiro passo para a evolução de um homem ou de uma nação”, neste caso a frase também é válida para as descobertas no conhecimento de si mesmo, descoberta de valores mas também de defeitos a serem corrigidos.